Como Formatar uma Franquia
De olho nos números vistosos registrados na última década, empresas de todos os portes e segmentos aderem todos os dias ao sistema de franquia. Essa transição, no entanto, não é uma tarefa simples. Esse é um mercado em que o conhecimento, a capacidade, o preparo e a experiência anterior valem ouro, tamanha é a complexidade envolvida no processo. Especialistas lembram que senso crítico, senso lógico e a capacidade de dar e receber instruções são vitais nessa evolução. A Associação Brasileira de Franchising (ABF), o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e consultores especializados dispõem das ferramentas necessárias para ajudar a atingir seus objetivos.
O Brasil é o terceiro País do mundo em número de franquias desenvolvidas (220 mil), superado apenas pela China e Estados Unidos, segundo o investigador e especialista no setor, Marcus Rizzo. Só em 2014 foram criadas 17.413 unidades de franquias, gerando mais de 155 mil empregos. O aumento nos últimos 10 anos foi de 127%.
Como procedimento inicial, o ideal é que o futuro franqueador se submeta a um estudo que analise e avalie o negócio por completo. “A análise de quanto conhece e domina sobre o conceito de negócio, o mix de produtos, o mercado, concorrência e público-alvo é essencial”, afirma a Diretora da consultoria Vecchi Ancona, Ana Vecchi.
De acordo com o diretor de Desenvolvimento da rede Megamatte, Rogério Gama, qualquer negócio pode se tornar uma franquia dependendo de dois fatores. “Primeiro que seja algo replicável em diferentes ambientes e contextos e não tenha aspectos limitadores; segundo que haja uma documentação dos processos envolvidos no negócio, garantindo a qualquer pessoa a possibilidade de adotar os mesmos padrões da empresa original e obter sucesso”, diz Gama.
Outro ponto importante para que a franquia de certo é o franqueador dominar totalmente a operação do negócio, dedicando a formatar o sistema de forma completa e que saiba como treinar seus franqueados acompanhando-os com uma equipe adequada. “A franquia é, acima de tudo, transferência de conhecimento, que se dá em treinamento, manuais e consultoria. A ausência de qualquer um desses três pilares fatalmente levará ao fracasso do franqueador e consequentemente, do franqueado”, comenta Gama.
Na visão dele, toda empresa franqueadora precisa ter no seu organograma, uma área de inteligência de mercado com possibilidade de análises concorrenciais e também macroeconômicas. “Somente de posse desse tipo de informação é que as franqueadoras poderão agir proativamente, e não apenas acompanhar as flutuações do mercado”.
Outro aspecto é aquele que diz respeito ao conhecimento que o empreendedor tem de gestão de negócios. Segundo ele, caso sua experiência seja basicamente comercial, não é nenhuma vergonha se cercar de consultores que possam apoiá-lo a desenvolver suas competências gerenciais. “A estruturação da empresa deve, de fato, ser feita não apenas de forma extremamente profissional, mas sobretudo, antes de iniciar o processo de concessão das franquias”, diz Gama.
Etapas
De acordo com Serrado, o processo de formatação é o momento em que a marca precisa encontrar o melhor modelo de negocio para as duas partes. Para isso é importante revisitar desde o posicionamento, missão e valores como também discutir muito bem o melhor perfil de franqueado que seja adequado a essa estratégia de crescimento e posicionamento. “Um bom contrato que reflita todos os pontos discutidos nesse processo de formatação é imprescindível para a segurança das duas partes”, afirma.
Segundo ele, as dificuldades do processo do Skipper e Pe ‘abi (restaurante de comida Japonesa) será encontrar o modelo de fornecimento que garanta a qualidade e que seja eficiente no abastecimento. “Além disso, a unidade inicial de treinamento também é um ponto ainda em discussão. As dificuldades do processo Peahi, que também prefiro chamar de desafio, estão mais em função de encontrar o modelo entre Gávea e Barra que seja mais lucrativo para os dois lados. Ou seja, um cardápio com o melhor custo/benefício (melhor markup), que não descaracterize o diferencial dos pratos. Estamos conseguindo”, garante Serrado.
Ainda segundo ele, em quatro anos a empresa contará com 40 unidades cada marca. “Para chegar nesse objetivo seremos fieis ao planejamento estratégico, com o estabelecimento das metas anuais com o constante investimento em marketing e na atualização dos produtos e lojas”, afirma Serrado.
Na opinião dele, o franchising permite que as marcas cresçam com uma velocidade bem maior do que se fosse apenas com capital e estrutura própria. “É um sistema que garante que as duas partes possam ter sucesso sem que uma se sobreponha a outra. Devemos levar em consideração que o franchising é um nicho da economia que segue tendo altas a cada ano”, opina.
Segundo o casal de empreendedores da franquia Tequesos, especializada em comida venezuelana, Vanessa Ferraz (arquiteta e brasileira) e Juan León (Designer gráfico, arquiteto e venezuelano) uniram seus conhecimentos de arquitetura comercial e branding para lançar no mundo das franquias, especificamente no setor de alimentação, um aperitivo tradicional da Venezuela. Com receita da família do Juan, tornou-se um sucesso nas festas e reuniões entre amigos e familiares no Brasil.
Segundo a empreendedora, a expectativa para este ano é ter 10 franqueados com os modelos de negócio em formato de carrinho, quiosque e foodtruck. “O processo de criação da franquia se baseia em pegar o modelo de negócio da empresa, potencializar suas virtudes e corrigir suas falhas para adaptá-lo a um modelo que permita expandir rapidamente e com baixo risco para a marca”, analisa. “Nossa maior dificuldade foi encontrar fonte de financiamento que nos permitisse iniciar o negócio e, em uma segunda fase, iniciar o processo de criação da franquia, obstáculos que temos superado com êxito”, ressalta Vanessa.
Expectativa
De acordo com o León, marca e produtos vêm tendo uma aceitação muito maior do que o esperado. “O mercado brasileiro busca novas experiências, novos sabores e com a nossa expansão conseguiremos suprir esta necessidade. Em quatro anos, esperamos estar nas cidades mais importantes do Brasil para futuramente internacionalizar nossa franquia em cidades onde o produto já é conhecido, como Cidade do Panamá, Miami e inclusive Caracas. Para esta última, tudo dependerá da situação socioeconômica e política do país”, cometa o venezuelano.
Segundo o sócio da marca Atama, voltada para a confecção de produtos para o esporte com foco nas lutas, Marcelo Porto, apesar do cenário econômico atual, as expectativas relativas ao crescimento e fortalecimento da marca são otimistas. “A formatação é dividida em etapas, entre as quais; análise de franqueabilidade consiste na análise dos números e do modelo de negócio, para conhecer a viabilidade; elaboração dos documentos jurídicos o contrato que define os direitos e deveres das partes envolvidas e os documentos exigidos pela lei do franchising e definição das estratégias e elaboração dos processos – com o know-how da franqueadora, são padronizados os processos administrativos e operacionais para auxílio do franqueado e bom andamento do negócio”, comenta Porto.
Ainda segundo ele, a expansão através das franquias ajuda no crescimento dos canais de distribuição e faz com que os produtos e a marca se fortaleçam e tenham uma maior ocupação territorial.
“Neste primeiro momento iniciaremos com as lojas franqueadas nos locais onde não possuímos distribuidores e revendedores. O lançamento de nosso modelo de franquia será na Feira de Franquia da ABF em São Paulo e já estudamos a implantação de algumas lojas no Rio de Janeiro e São Paulo até 2016. Estamos aprimorando nossos processos e investindo em infraestrutura para expandir este número de loja nos próximos anos”, revela.
Plano de negócios
Nesta fase é feito um estudo que avalia o mercado e a empresa em seu estágio atual, objetivando conhecer se é recomendável utilizar o sistema de franquias para a expansão da marca e distribuição dos seus produtos e serviços.
Aqui é definido o modelo de franquia e os padrões a serem adotados, são levantados os investimentos necessários à sua implantação e projetados os resultados desta operação. A operação precisa ser rentável para o franqueador e para os futuros franqueados e sua atratividade comparada a outros investimentos do mercado.
Estes dados serão fundamentais para a definição do plano de expansão e estratégia de abertura das unidades. Define-se nesta etapa, com base nos resultados obtidos, o prazo de retorno para o capital investido, a taxa de franquia, dos royalties, fundo de propaganda e demais taxas a serem cobradas dos franqueados. Aqui será avaliado o investimento que o franqueador precisará fazer para ajustar o modelo e definida a estrutura da franqueadora para a gestão do sistema e oferecimento de suporte à rede.
Com estes dados em mãos elabora-se um Plano de Expansão, de acordo com o perfil do negócio e características do mercado, e define-se o perfil do franqueado que irá operar as unidades.
Instrumentos jurídicos
Esses documentos são redigidos de acordo com o que determina a Lei 8.955/94, como a Circular de Oferta de Franquia (COF), o Pré-contrato e Contrato e as características de cada franquia.
Algumas consultorias acrescentam outros documentos, como recibos e protocolos de entrega de documentação para os franqueados ou orientações para filiação da franquia junto à ABF.
Manualização
Em seguida serão estruturados os manuais da franquia, tanto os que orientarão os franqueados, quanto os que nortearão os trabalhos a serem executados pela equipe da franqueadora. Aqui será detalhado o projeto arquitetônico e de decoração, serão mapeados os processos, definido o sistema de gestão e tudo o que será objeto de treinamento e de padronização dentro da rede.
Caso ainda não tenha sido feito, é recomendável que esse modelo seja testado em uma unidades-piloto, para que sejam reproduzidas as condições que serão enfrentadas pelos franqueados no dia a dia da operação e para que sejam feitos os ajustes necessários ao modelo.
Após esses passos, e desde que já esteja estruturada internamente, a empresa já terá condições de pôr em prática seu Plano de Expansão, com a seleção dos candidatos e a venda das franquias.
Avaliando a capacidade de investimento
Erram aqueles que acreditam ser possível implantar uma rede de franquias valendo-se dos recursos que serão captados com a venda das primeiras unidades.
Até a rede atingir seu ponto de equilíbrio, será exigida uma sólida capacidade financeira da empresa franqueadora, sem que ela possa contar unicamente com os recursos advindos das unidades franqueadas. Por isso, deve-se avaliar o custo de implantação do Plano de Expansão da franquia, ter uma cuidadosa avaliação da projeção dos resultados e do prazo para o retorno do capital que será investido.
É aconselhável que o franqueador tenha capital próprio para suportar o investimento nas primeiras unidades e que comece a expansão partindo de uma rede regional para depois atingir outros mercados.
O franqueador precisa estar pronto para dar suporte aos franqueados e, se houver necessidade e for estrategicamente recomendável, até mesmo recomprar uma unidade cujo franqueado queira sair da rede ou cujo contrato tenha sido cancelado.
Caso não tenha estes recursos, e ainda assim queira iniciar a expansão, o empresário poderá se valer de algumas estratégias para captação de recursos de terceiros, como a busca por um Sócio Investidor ou linhas de financiamento disponibilizadas pelos bancos e agências de fomento, sempre avaliando as condições desses financiamentos e sua capacidade de pagamento para não colocar em risco a saúde financeira da empresa.
Franquear um negócio custa mais caro e é mais demorado do que normalmente se imagina. É preciso cuidar para que o percentual de comprometimento do faturamento não inviabilize a própria empresa.
Processos e estratégias
Devido à importância dos processos para a padronização das atividades nas redes de franquias, torna-se fundamental decidir quais processos devem ser mapeados e incluídos nos manuais que serão entregues à equipe da empresa franqueadora e aos franqueados e que servirão de objeto de análise de conformidade nas consultorias de campo.
Para definirmos quais processos padronizar é preciso conhecer seus impactos junto aos clientes e as vantagens que o franqueador e os franqueados terão em padronizá-los. Processos simplificados e bem estruturados podem reduzir o tempo e os custos envolvidos na execução de uma atividade, serem mais facilmente repassados nos treinamentos e permitirem um melhor acompanhamento da sua execução, gerando um maior controle da qualidade final dos produtos e serviços oferecidos aos clientes.
Mas como priorizar o que deve ser padronizado? Em princípio começando por aqueles processos que trouxerem riscos à segurança, ganhos operacionais e que estejam mais diretamente relacionados com o diferencial competitivo da franquia e, portanto, valorizados pelos clientes.
Cabe lembrar que os processos devem ser integrados e que quando atendem bem ao propósito para o qual foram criados, são mais facilmente assimilados. E, para que os melhores resultados sejam alcançados eles precisam ser flexíveis, visando a sua melhoria e adaptação a novas situações.
Definindo as estratégias
A vontade associada à necessidade de expansão dos negócios é traço comum entre as empresas que pensam no franchising como um canal de distribuição para seus produtos e serviços. Mas antes de iniciar esse processo, é preciso que as estratégias estejam claramente definidas, as potencialidades e necessidades de ajustes internos devidamente analisados, bem como o conhecimento das oportunidades e ameaças do mercado no qual a empresa atua ou pretenda atuar.
Ao pensar em criar uma rede de franquias o empresário precisa não só conhecer a operação do seu próprio negócio, como saber o quanto e o que é viável ser reproduzido neste formato.
Ter um negócio de sucesso não garante os mesmos resultados quando um modelo idêntico é replicado por terceiros em outros mercados.
O planejamento, embora não evite integralmente o risco, aumenta as chances de que ambos os negócios deem certo. Para o franqueador, que identificará sempre novas oportunidades para que sua franquia se mantenha no mercado; para o franqueado, que contará com inovações que o mantenha competitivo neste mesmo mercado.
Definir estratégias é planejar, é ter uma visão ampla do que se quer, do que é preciso fazer para alcançar o que se deseja, saber como será feito, quanto será necessário e quando deverá ser colocado em prática.
Não planejar pode colocar em risco não só a franquia como o próprio negócio.